sexta-feira, 12 de agosto de 2011

DIVERSIDADE LINGUÍSTICA, LÍNGUA DE CULTURA E ENSINO PORTUGUÊS

Walkiria Assunção

Qualquer individuo normal que entra na escola para ser alfabetizado em sua língua materna já é senhor de sua língua, na modalidade oral própria a sua comunidade de fala. Admitindo esse principio, qualquer trabalho de ensino da língua materna se constitui em processo de enriquecimento do potencial lingüístico do falante nativo, não se perdendo de vista a multiplicidade de comunidade de fala que compõem o universo de qualquer língua natural, multiplicidade que variará, a depender das características de cada uma, enquanto língua histórica, isto é, língua inserida tanto sincrônica quanto diacronicamente no contexto histórico em que se constitui e em que se constituiu.
A distorção no desenvolvimento do ensino da língua portuguesa ao longo das séries escolares é facilmente explicável quando refletimos sobre o processo pedagógico que envolve esse ensino.
O “ bidialetalismo funcional”, atitude recente na teoria da metodologia do ensino de português, discutido por Magda Soares no livro Linguagem e escola. Uma perspectiva social, possivelmente surtiria efeito para novas propostas de ensino. Esse bidialetalismo , a referida autora o enriquece e reformula, no livro citado, em bidialetalismo em uma escola transformadora, que opõe a escola redentora à escola reprodutora e impotente. Levando o bidialetalismo funcional ao âmbito da escola transformadora, a autora transfere adequadamente para o nível político a questão do ensino da língua no âmbito da escola. E é político, não apenas científico e técnico, o problema.
A oralidade de todos os que se iniciam na escola e a oralidade de grande parte que provem de grupos sociais que vivem basicamente na oralidade fica ignorada. As Diretrizes, portanto, podem ser definidas, sem receio de errar, como propondo uma escola redutora e reprodutora da situação sociocultural que, sem convicção embora, crítica no inicio de sua introdução.
Não é, certamente, por seu caminho que se chegará ao que suponho deva ser uma verdadeira democracia lingüística ou, para fugirmos ao já tão desgastado termo, ao verdadeiro domínio da língua portuguesa e não apenas ao da “ língua de cultura”, por todos aqueles que são usuários.
Se a criança de 6 anos que sabe português e o jovem universitário aceita que não sabe e muitos adultos sabedores defendem esse não saber, o que está posto indica que o trabalho pedagógico para o ensino da língua portuguesa não vai pelo caminho adequado e que a escola descumpriu sua missão __ em vez de fazer aprender, faz desaprender. E é essa a situação mais freqüente. Por onde recomeçar, refazer?
Essa pedagogia voltada para o todo da língua e não para algumas de suas formas, decerto socialmente privilegiadas, levará o individuo a, desde o momento em que começa a refletir sobre a língua __ o que se processa desde a alfabetização __, ter consciência de que saber falar a língua que fala todo dia, mas que precisa saber mais sobre ela e que esse saber pode crescer com ele por toda a sua vida.
Cabe, portanto, ao ensino de português nas séries escolares fazer os indivíduos perceberem que a aquisição lingüística é um processo continuo de conhecimento e de re-conhecimento da multiplicidade de manifestações possíveis de sua língua __ desde os extremos dos usos populares aos extremos dos usos acadêmicos, perpassando por eles as variedades regionais __ e que poderão dar a qualquer um o poder que têm o direito de ter sobre a língua materna.

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